Skip to main content

A construção de currículos nas IES brasileiras tem sido fortemente influenciada pela necessidade de redução de custo e pela demanda de aumentar a nota nos indicadores do MEC. No viés
financeiro, a questão é diminuir a carga horária total do curso. Em relação aos indicadores, a ideia é ter menos disciplinas na organização curricular para ter menos professores e mais titulados.

Mas será que as IES estão no caminho certo, quando focam a elaboração dos seus currículos no aspecto financeiro e no desempenho dos índices do MEC?
Nesse contexto, podemos relacionar a construção dos currículos com a satisfação do aluno e a qualidade do ensino. Aluno satisfeito, motivado e melhor preparado possibilita a diminuição da evasão e também o aumento nos resultados dos indicadores do Ensino Superior.

Vários fatores são importantes na rela­ção currículo e retenção, principalmente pensando nos alunos ingressantes, mas, neste artigo, vamos analisar o tema sobre três aspectos: o design curricular, a entrega do currículo e a avaliação.

Design curricular

Diva Spezia Ranghetti e Verônica Gesser, autoras do artigo O currículo no Ensino Superior: princípios epistemológicos para um design contemporâneo, citam a importância da prática na construção do currículo, afirmando ser possível sua inclusão já no início do processo de construção do conhecimento. Trabalhá-la desde o princípio é facilitar o processo de engajamento
do aluno, reduzindo a possibilidade de evasão no momento em que ela mais acontece. Normalmente, observa-se o contrário: o início do curso é cheio de teoria, e a prática acontece mais
nos últimos módulos. Alguém pode dizer que vai faltar a teoria, mas essa pode ser dada junto com a prática, num processo mais envolvente de aprendizagem.

33 Revista Linha Direta

Muitos cursos de engenharia têm feito mudanças em seu currículo para distribuir as disciplinas de cálculo em mais períodos, tentando diminuir a evasão de alunos. Mas é necessário mais do que
isso: introduzir projetos e novas metodologias no primeiro ano, tais como projeto de protótipo ou processo, em um curso de engenharia, ou criar uma empresa,
em um curso de administração. No artigo Inovação curricular no Ensino Superior, Marcos Tarciso Masetto apresenta diversos projetos curriculares inovadores. Um deles, o de Formação
dos Médicos de McMaster, iniciado em McMaster University, em Hamilton/Ontário, que foi assumido pela Faculdade de Medicina de Harvard, coloca p aluno em contato com a prática pro
fissional a partir do primeiro ano de medicina, diferentemente de outros cursos, que só têm esse início a partir do terceiro ano. A área de saúde já utiliza a prática desde o começo, parale
lamente à teoria, demonstrando queas duas podem caminhar juntas, tornando a aprendizagem mais interessante e significativa.

O currículo do curso deve ser desafia dor e elaborado com foco na retenção do estudante. Na montagem, deve-se conhecer melhor o aluno ingressante, suas aspirações, motivações, experiên
cias e conhecimentos.

Entrega do Currículo

A entrega do currículo é o momento da aprendizagem. A pessoa mais importante nesse momento é o aluno, mas quem pode determinar o sucesso ou insucesso da entrega é o professor. Por
tanto, é importante que o docente esteja consciente e bem -preparado no seu papel de facilitador da aprendizagem.

Não adianta construir um currículo envolvente se ele não der continuidade ao trabalho de motivar o aluno. A subjetividade do educador e a forma como ele irá encarar o currículo são fatores
determinantes.

Os recursos materiais utilizados e o ambiente de sala de aula também são importantes em um processo de aprendizagem. Um bom planejamento curricular demanda a disponibilidade de recursos e ambientes apropriados. Gestor acadêmico, coordenador e professor deverão estar envolvidos no planejamento e execução de um
currículo envolvente para os alunos, providenciando as metodologias, recursos e ambientes necessários à aprendizagem.

Outro fator fundamental é a interação do professor com os estudantes. O docente tem que estar disponível, conhecer os seus alunos, ser simpático e criar boas expectativas.

Avaliação e Currículo

A avaliação na relação com o currículo pode ter duas funções importantes: dar feedback sobre a construção do mesmo e medir a aprendizagem do aluno. Na primeira, os professores podem ter um retorno sobre o currículo e o seu ensino e podem saber onde precisam melhorar. Na segunda, tanto o aluno quanto o professor têm condições de saber o desempenho do estudante e onde ele precisa melhorar. O início do curso é um período de transição, e o que geralmente acontece é de o ingressante ter que se adaptar ao curso, ao currículo, à avaliação, ao professor, enfim, a todo o sistema. Esse é um momento crítico, em que muitos alunos evadem, porque não se adaptam como deveriam. Por que não facilitar a adaptação, promovendo modifica­ções que possam ajudá-los? Uma pos
sibilidade nesse sentido é utilizar, no primeiro ano do curso, a avaliação formativa, em que se é avaliado pelo seu desempenho em aprender, e não pelas notas de provas e tarefas.
O currículo pode ser construído para promover o engajamento do estudante ao curso e motivar a sua permanência.
Se bem-feito e utilizado, pode ser uma ferramenta estratégica no processo de retenção do mesmo.


Artigo originalmente publicado em:

SCHEIDEGGER
, Rogério. Currículo e Retenção de alunos no Ensino Superior. Revista Linha Direta. Belo Horizonte, n. 220, p. 22-24, jul. 2016.